Art. 1º. O
processo civil será ordenado e disciplinado conforme as normas deste Código.
Comentários – O princípio base e fundamental do
processo civil, sustentáculo de todos os demais princípios, é o princípio do devido processo legal, consagrado pelo
art. 5º, LIV, da Constituição, de que “ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”.[1]
Registra Nelson Nery[2]
que bastaria a norma constitucional haver adotado o princípio do devido processo legal, para que daí decorressem todas as consequências
processuais que garantiriam aos litigantes o direito a um processo e a uma
sentença justa.
Estabelece o art. 1º que “o processo civil será ordenado e disciplinado
conforme as normas deste Código”.
Essa regra, inédita no
processo civil brasileiro, revela um compromisso do novo Código com o devido processo legal, o que se obtém
através da tutela jurisdicional adequada,
efetiva e tempestiva dos direitos[3].
O art.
1º torna claro aquilo que, no contexto do Código de 1973 está implícito,
porque, também neste, o processo civil é, implicitamente, ordenado e disciplinado conforme as suas normas.
Diferentemente
de outros Códigos, que disciplinam, além do processo civil, o processo
trabalhista, o processo arbitral, o processo comercial etc., a alusão ao
processo “civil” faz sentido para identificar esse tipo de processo, mas, no ordenamento jurídico
brasileiro, em que o Código de Processo Civil disciplina apenas e tão somente o
processo civil, bastaria o legislador dizer --, na medida em achou necessário
--, que “o processo será ordenado e disciplinado conforme as normas deste
Código”, porque não poderia ser outro senão o processo civil.
Tenho
observado que, apesar dos princípios, constitucionais e processuais, o processo
civil não tem funcionado a contento, não por conta das normas que são racionais
e razoáveis, mas por conta da péssima estrutura da justiça brasileira que não
acompanha o aumento das controvérsias, com os cidadãos cada vez mais
conscientes dos seus direitos e dos desmandos do Estado. Enquanto as
controvérsias crescem numa escala geométrica, a estrutura judiciária cresce
numa escala aritmética, de modo que nunca será suficiente para dar resposta aos
reclamos da sociedade.
Não
apenas as normas do novo Código ordenam e disciplinam o processo civil,
porquanto este é informado também por normas de direito constitucional processual e por normas de direito processual constitucional, sendo este a reunião
dos princípios para o fim de regular a jurisdição constitucional, e aquele o
conjunto das normas de direito processual que se encontra na Constituição[4].
Normas
típicas de direito constitucional
processual, dentre outras, se encontram, por exemplo, no art. 5º, XXXV, da
Constituição, dispondo que “a lei não
excluirá da apreciação do Poder Judiciário
lesão ou ameaça a direito”, e no art. 8º, III, dispondo que “ao sindicato cabe a defesa dos direitos e
interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais
ou administrativas”.
De
outra parte, normas de direito processual
constitucional são, dentre outras, as contidas no art. 5º, LXIX, da
Constituição, dispondo que “conceder-se-á
mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de
poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de
atribuições do poder público”, e no art. 5º, LXXI, prevendo que “conceder-se-á mandado de injunção sempre que
a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e
liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à
soberania e à cidadania”.
A Constituição não distingue
entre princípios de direito
constitucional processual e princípios de direito processual constitucional, limitando-se a enunciar, no
elenco dos direitos e garantias fundamentais, aqueles princípios que asseguram
ao jurisdicionado uma justiça segundo o enunciado do princípio fundamental e
básico do devido processo legal.[5]
Como se
vê, não é por falta de “princípios” que a justiça brasileira não funciona, mas
por falta dos “meios” e dos “fins”, de modo que quando os princípios encontrarem
meios para se viabilizarem e alcançar a sua finalidade terá alcançado uma
evolução mais condizente com a sua vocação constitucional.
Mesmo que o Código tivesse omitido o preceito
do art. 1º, como fizeram seus ancestrais, nenhuma falta faria, porque objetivo das normas processuais é fazer
funcionar o processo, pelo que não deixaria ele de ser ordenado e disciplinado
pelas normas que consagra.
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