sábado, 9 de julho de 2011

HOMENAGEM DO ADVOGADO RENATO DE MORAES AO DES. FED. RICARDO REGUEIRA

         Ficam as lembranças e a dívida de amizade.


Por RENATO DE MORAES


Quando, na manhã do dia 7 de julho de 2008, chegou-me a notícia de que o desembargador Ricardo Regueira falecera, o primeiro impulso foi desacreditar.
Dez dias antes, Ricardo estivera comigo, em minha residência, e, ao longo de horas, ladeados por meus irmãos e um dileto amigo, proseamos, madrugada a dentro.
Fazia tempo que não conversávamos.
Pusemos a conversa em dia. E jamais poderia cogitar de que se cuidaria de uma despedida.
Todos que desfrutaram do convívio de Ricardo bem sabem que a plena alegria de viver já o abandonara, por conta do brutal assassinato de seu filho, mais uma vítima registrada na estatística oficial da insegurança pública.
Mas, me impressionou, naquela agradável noite, a sua disposição em papear e, até mesmo, o humor com que descreveu episódios injustos, de triste recordação.
A bem da verdade, Ricardo exercitava, a fórceps, o aprendizado de habituar-se à dor da perda.
Por isso, a notícia de sua morte, decorrente de problemas de saúde, contrastava a presença vivida, bem humorada e, como sempre, inteligente, que contagiou a todos.
No final do encontro, dei-lhe o livro “A lição Final”, de Randy Pausch com Jeffrei Zaslow, que trata da palestra de despedida de um prosaico professor norte-americano, pai de família, com três filhos ainda crianças, depois de descobrir que só lhe restavam seis meses de vida, em razão do prematuro diagnóstico de “dez tumores no fígado”.
A escolha do regalo partiu do ensinamento contido no pequeno livro sobre como enfrentar e superar as adversidades, tarefa, em demasia, cometida a Ricardo pela vida. Logo na introdução, que lemos em voz alta, o professor Randy Pausch falava que “planejar não significa obter soluções perfeitas; significa fazer o melhor possível com recursos limitados”.
A confirmação da partida inesperada do amigo, colhido pela “indesejada das gentes”, na feliz expressão de Manuel Bandeira, sem que tivesse oportunidade de cumprimenta-la e dizer-lhe: “o meu dia foi bom, pode a noite descer”, faz que os amigos não consigam honrar uma dívida, ainda que muito difícil de ser honrada: a dívida da amizade.
Marcou a trajetória de Ricardo, mais que tudo, a virtude rara de ter sido amigo dos seus amigos, incondicionalmente.
Resta, somente, lembrar para confortar os que ficam, o “Consolo da praia”, de Drummond, e crer que, enfim, o amigo encontrou o merecido descanso, a paz celestial, a despedida daqueles que fustigaram a sua adoração existência física:
Vamos, não chores.
A infância está perdida.
A mocidade está perdida.
Mas a vida não se perdeu.
O primeiro amor passou.
O segundo amor passou.
O terceiro amor passou.
Mas o coração continua.
Perdeste o melhor amigo.
Não tentaste qualquer viagem.
Não possuis casa, navio, terra.
Mas tens um cão.
Algumas palavras duras,
Em voz mansa, te golpearam.
Mas e o humor?
A injustiça não se resolve.
À sombra do mundo errado.
Murmuraste um protesto tímido.
Mas virão outros.
Tudo somado, devias
Precipitar-te de vez nas águas.
Estás nu na areia, no vento ...
Dorme, meu filho.
Os anos passam e a saudade – “o sal das lágrimas ou do sol da idade”, como referia o mulíplice Waly Salomão – só aumenta.

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